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30 anos das eleições santistas de 1984: entrevista com Esmeraldo Tarquínio Neto

“Sequelas da ditadura serão sentidas para sempre”

Tarquínio relembra episódios do 3 de junho de 1984
Há 30 anos os santistas puderam, finalmente, votar para prefeito, direito que havia sido tolhido pela ditadura militar em 1969. O Macuco Blog e o Ó Minha Santos conversaram, por facebook, com um dos protagonistas daquele pleito de 1984, Esmeraldo Tarquínio Neto, vice-prefeito na chapa de Oswaldo Justo, a quem os santistas elegeram prefeito naquele histórico 3 de junho de três décadas atrás. Ambos eram candidatos pelo PMDB. O pai de Tarquínio Neto, Esmeraldo Tarquínio Filho, tinha sido o vencedor da última eleição para prefeito ocorrida em Santos, em 15 de novembro de 1968. Não assumiu porque fora cassado pelo regime. Justo, por sinal, era o vice, e não aceitou ser empossado naquelas condições.

Confira a entrevista:

Macuco Blog | O senhor foi candidato a vice-prefeito naquele ano, na chapa do Justo. Como foi a campanha eleitoral? Quais eram os principais temas, os principais desafios de Santos colocados em discussão na campanha?

Esmeraldo Tarquínio Neto | A campanha eleitoral de 1984 teve algumas características essenciais: a retomada da autonomia política da cidade, após a sua perda em 1969; a primeira eleição direta após 16 anos e a enorme contribuição para a recuperação da plenitude do exercício democrático que havia sido tomado do povo brasileiro em 1964 pelo golpe civil e militar. A eleição de Santos seria realizada inicialmente em 18 de dezembro de 1983, mas foi cancelada pela Justiça Eleitoral, tendo sido remarcada para o dia 3 de junho de 1984. O PMDB tinha três chapas (Justo/Tarqüinio, Lara/Fabiano e Castilho/Adelino) e foram as duas primeiras que disputaram mais acirradamente o pleito, com um franco favoritismo para a segunda chapa. Esse favoritismo foi sendo neutralizado pela chapa de que eu fiz parte, pois era através dela que se recuperaria parte da história perdida e desperdiçada da cidade, após a última eleição realizada em 1968 em que foram eleitos Esmeraldo Tarqüinio, meu pai, tendo como vice o Oswaldo Justo. Os principais temas e desafios campanha foram a recolocação de Santos nos trilhos do desenvolvimento, porque há de se considerar que a cidade foi a mais prejudicada dentre as cidades brasileiras após o golpe, pois fomos perdendo tudo o que havíamos conquistado pela riqueza proporcionada pela exportação de café, por exemplo, e depois disso sempre tivemos dificuldades em nos recuperar, A cidade via as alternativas de desenvolvimento serem diminuídas rapidamente (lembremo-nos da paralisação das atividades da Santa Casa de Santos e a greve no Porto de Santos) e sem nenhuma perspectiva de reação econômica, pois vínhamos perdendo para outros centros muito do que aqui poderia ser feito. Então, para a cidade não era apenas um novo processo eleitoral que seria realizado para reparar a estupidez cometida anos antes.

Macuco Blog | Especificamente daquele 3 de junho de 1984, quais as lembranças que ainda guarda na memória? Como foi o dia, qual era o clima na cidade, que hora foi votar, como foi acompanhar a apuração, qual a reação diante do resultado das urnas...? 

Tarquínio Neto | Guardo muitas lembranças. Primeiramente, a noite bem dormida; e, ao acordar, me deparei com um sol inesquecível, típico de outono. A cidade estava tomada por jalecos amarelos, que além de identificar a nossa armada, permitia que os nossos entusiastas e colaboradores pudessem guardar o material para ser oferecido aos eleitores, pois naquela eleição não havia proibição de distribuição de material e o material era oferecido e não simplesmente distribuído aos eleitores. Diga-se de passagem a ideia dos jalecos partiu da minha mãe e foi realizada pelo costureiro e carnavalesco Carioca, que tinha um ateliê no bairro do Boqueirão. O dia foi marcado por várias curiosidades, mas uma delas certamente impulsionou a vitória: havia muitos colaboradores de outras chapas que vieram de outras cidades, mas que encantados com as belezas da nossa cidade resolveram aproveitar o dia de sol e partiram para a praia e curtiram o dia de sol enquanto nós continuávamos com a atenção voltada para a eleição. Sem dúvida, o grande diferencial do resultado daquele dia foi a participação – decisiva – dos nossos colaboradores que não arredaram pé dos locais de votação, trabalhando até o fim do dia. E tiveram a sua recompensa. Mas do que mais me lembro era do clima de festa pela nossa cidade que se estabeleceu desde as primeiras horas dia.

Macuco Blog | Passados 30 anos, em sua avaliação o que mudou na sociedade santista em termos de mobilização popular, de participação na política? Os 20 anos de ditadura deixaram sequelas ainda sentidas?

Tarquínio Neto | A cidade pode participar de oito processos eleitorais que se completaram sem maiores perturbações. Houve organização através da participação popular e democrática em torno de entidades de que defendem os interesses dos cidadãos santistas. Por outro lado, a característica conservadora do conjunto dos santistas vem se solidificando, o que pode representar um retardamento nos avanços sociais alcançados de forma equilibrada. Quanto às sequelas deixadas pela ditadura, isso nós continuaremos sentindo para sempre, pois o que perdemos, o que deixamos de evoluir econômica e socialmente nunca será recuperado. Mas é certo que os santistas temos a capacidade de olhar para a frente e vislumbrar um futuro que seja compensador.

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