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quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Um debate engessado na pauta

Horário e exclusão de nomes também são pontos negativos
Faltou pluralidade de pontos de vista nos questionamentos feitos aos candidatos no evento da Band desta terça-feira, dia 26.

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Postado de Curitiba

Perdi a primeira hora do debate dos presidenciáveis promovido ontem pela Band porque estava trabalhando, e muita gente perdeu a última hora porque precisou dormir - afinal, acorda cedo para a lida diária.

Está aí uma crítica: o horário. Impossível para o trabalhador, para o estudante, para a dona de casa ficar até meia-noite, uma hora da manhã acordado.

Pior: acordado para ver mais do mesmo.

Se nas últimas eleições o formato é que estava engessando os confrontos, desta vez até que houve certo dinamismo na forma. No que se refere à pauta, porém, foi o debate do discurso único.

As perguntas da equipe de jornalismo da Band tiveram exclusivamente o ponto de vista do pensamento à direita, neoliberal, conservador. 

Aquelas baboseiras de "ameaça bolivariana", "bolsa-assistencialismo", "antopólogos defendendo indígenas", "censura da mídia", comuns nas aberrações do facebook, foram literalmente expressas nas "perguntas" dos arautos.

Nenhum questionamento sobre necessidade de reforma agrária, de um reforma urbana que ponha fim à especulação imobiliária a qual encarece moradia, por exemplo; nada sobre distribuição de renda, sobre mercantilização da educação, da saúde, da água, nada, nada, nada...

Enfim, um debate para empurrar o processo eleitoral para o campo da direita; para encurralar os candidatos para o campo da direita.

Considero, portanto, que a candidata do Psol, Luciana Genro, foi a grande "vencedora" do debate, porque não se absteve de reiterar com clareza e contundência seus posicionamentos à esquerda, que iam de encontro às pautas trazidas pelos debatedores.

Chegou, inclusive, a expor essa tentativa de encurralamento. Depois, por exemplo, de uma pergunta tosca do veterano José Paulo de Andrade, quando acusou "os políticos" de não entenderem "o recado" das manifestações de junho de 2013, Luciana, com firmeza mas gentileza, disse que, com aquela questão enviesada (defendendo polícia repressora), o jornalista "é que não tinha entendido" tal recado.

Eduardo Jorge em boa parte dos momentos também não se curvou e defendeu bandeiras da esquerda. Mas se acuou na principal delas, e na mais difícil de conquistar espaço: a reforma da mídia. Teve essa chance quando questionado por Bóris Casoy. Aproveitando-se da bizarra construção da pergunta feita pelo apresentador, se esquivou pela ironia. Poderia ter falado sério sobre um assunto sério.

Levi Fidélix surpreendeu ao ser enfático na crítica à política monetarista do Brasil nos últimos 20 anos, política essa que suga dinheiro da educação, da saúde, da segurança, da agricultura familiar, pra irrigar os lucros dos bancos. "Vocês estão debatendo essas coisas pequenas [referia-se a uma discussão sobre número de ministérios e de cargos em comissão], quando o grande problema é o dinheiro que vai para pagamento de juros da dívida".

Pastor Everaldo foi, ao menos, transparente. Deixou claro seu posicionamento conservador no que diz respeito a comportamentos e sua ideologia neoliberal privatista.

Transparência que tem faltado a Marina Silva e não foi diferente no debate. Para os descontentes "com tudo o que está aí" o discurso dela segue agradando e encontrando eco. Continua sem dizer, todavia, o que não é o "tudo que está aí" que ela defende. Foi cobrada disso por Eduardo Jorge e Aécio Neves.

O ex-governador de Minas, por sinal, pra mim foi o mais fraco no debate. Não sabia se atacava Dilma ou Marina, ou se focava em exaltar suas propostas. Aceitou, convenientemente, o encurralamento à direita da pauta do debate, a ponto de antecipar que, se eleito, nomearia Armínio Fraga para o ministério da Fazenda. Para alegria dos banqueiros, entre eles da turma do Itaú que apoia Marina Silva.

O forte de Dilma nunca foram os debates, pela dificuldade que tem em se expressar. Está, no entanto, bem mais habilidosa que quatro anos atrás e, se não teve um desempenho brilhante, também não foi comprometedor. 

Como os principais oponentes (Marina e Aécio) precisam cada vez mais se preocupar em disputar a mesma fatia do eleitorado, Dilma acaba, de certa forma, ficando mais na posição de espectadora, de defesa dos feitos de seu governo e o de Lula. É como o time que entra em campo já classificado para a fase final, toca a bola apenas esperando o adversário.

Pra terminar: debate justo é aquele com todos os candidatos. Essa história de garantir participação só aos partidos com representação no Congresso cerceia o direito à manifestação. 

Inadmissível um evento que se propõe a esclarecer uma decisão importante do eleitor - o seu voto - não contar com os outros postulantes (Mauro Iasi, Zé Maria, Rui Pimenta e Eymael) ao cargo. A legislação eleitoral deveria proibir essa exclusão.

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